Bondinho do Pão de Açúcar - Rio de Janeiro-RJ |
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projeto era ousado. Construir um caminho aéreo
entre os dois morros da enseada da Baía de Guanabara. O ano, 1908. Quatro anos
depois, o primeiro trecho, ligando a Praia Vermelha ao Morro da Urca, foi
inaugurado. O bondinho comportava 22 passageiros, era de madeira e sustentado
por apenas um cabo de aço. O segundo trecho do percurso, que ligaria o morro do
Pão de Açúcar, entrou em operação no ano seguinte. Até então só existiam dois
teleféricos no mundo: o do Monte Ulia, na Espanha (com 280 metros de extensão),
e o de Wetterhorn, na Suíça (com 560 metros). Nada que se comparasse, portanto,
ao Pão de Açúcar, cujas duas linhas somam 1 263 metros. “Como não havia helicópteros, a
construção utilizou equipes de alpinistas especialmente treinados, que levavam
as peças nas costas, em escaladas perigosas”, diz Giuseppe Pellegrini,
diretor técnico da empresa que administra os bondinhos.
No
próximo dia 27 de outubro, um dos cartões-postais mais famosos do Rio, e do
Brasil, completa 100 anos. O idealizador do bondinho foi o engenheiro Augusto
Ferreira Ramos, que buscava uma idéia para alavancar o turismo na cidade. Ao
conseguir capital e apoio do governo, ele fundou a Companhia Caminho Aéreo Pão
de Açúcar, a mesma que administra o local até hoje. No ano passado, o bondinho
contabilizou recorde de viagens. Foram 77.441 percursos nos dois bondinhos.
Da
Praia Vermelha ao Morro da Urca, a distância é de 528 metros, percorridos a uma
velocidade de aproximadamente 22 km/h, com tempo total de 3 minutos. Da Urca
até o Pão de Açúcar, a distância é de 735 metros, percorridos a uma velocidade
de aproximadamente 31 km/h, com tempo de viagem também de 3 minutos. Aos mais
aventureiros, é possível subir o morro da Urca por uma trilha. A distância é de
1487 metros e exige esforço físico e preparo para escaladas íngremes e
escorregadias. A trilha tem início pela pista Claudio Coutinho, em área
militar. Micos, pássaros de diferentes espécies, flora típica da Mata Atlântica
e as ondas da praia Vermelha compõem o cenário abaixo dos bondinhos.
Taxistas
e cobradores de estacionamento são os primeiros a abordar quem chega próximo à
bilheteria. O ingresso custa R$ 53,00 (estudantes e idosos pagam meia). As
filas não são grandes durante a semana. Em 2011, foram 1.331.487 visitas. É,
junto com o Cristo Redentor, o ponto turístico mais visitado do Rio. O trem do
Corcovado recebe anualmente 1 milhão de visitantes. Em termos comparativos, a
Torre Eiffel, símbolo de Paris, recebe uma média de 7 milhões de visitantes a
cada ano. Mas ali o que não falta é beleza. A visão a mais de setecentos metros
de altura é estonteante. Pode-se ver toda a extensão da Baía da Guanabara, a
ponte Rio - Niterói, a praia de Copacabana, a cidade de Niterói no canto
direito e, ao fundo do lado oposto, o Corcovado, a pedra da Gávea e o morro
Dois Irmãos.
DE CAMELÔ A SÍNDICO DO BONDINHO
Antonio
Lourenço, mais conhecido como Seu Gato, é o funcionário mais antigo do Pão de
Açúcar. É o responsável pela oficina e manutenção de todo o mecanismo que faz
os bondinhos funcionarem de segunda a segunda, sempre das 8h às 21h. Não por
acaso é chamado por alguns como “síndico do bondinho”. Sua história se confunde
com a do local. Começou como camelô nos arredores do morro, vendendo sucos,
refrigerantes e doces para os turistas. No começo dos anos 70, o velho bondinho
já não dava conta do intenso tráfego turístico que só crescia.
Foi
então construída outra linha, mais segura, com novos cabos, estações e carros,
multiplicando por dez a capacidade de transporte. Seu Gato foi recrutado para
auxiliar. “Estava ali embaixo todo dia, conhecia o pessoal. Daí me chamaram e
fui. Em seguida fiz curso de soldador e maçariqueiro e continuei empregado até
hoje”, diz ele, aos 72 anos.
Seu
Gato não precisou arriscar sua vida na adaptação dos novos bondinhos. Se na
primeira vez, os cabos de sustentação foram instalados com ajudas de
alpinistas, agora tudo foi feito com auxílio de um elevador de peças paralelo
aos bondinhos. A nova linha foi inaugurada em 1972 e, com algumas reformas,
ficou em operação até 2008. Foi substituído por outro, mais moderno, de
designer suíço – com vidro fumê, o que possibilita fotos mesmo contra o sol. A
capacidade diminuiu: de 75 para 65 passageiros por viagem. “Não vejo uma pessoa ao menos
subir o morro estressada e chegar aqui em cima mantendo a irritação. Não tem
como. Só a vista já é uma terapia”, diz Seu Gato.
BOTÃO DE EMERGÊNCIA
O
complexo do Pão de Açúcar tem duas salas de máquinas, ambas no primeiro morro,
o da Urca. Três geradores ficam de prontidão para caso haja falta de energia. O
motor principal tem 320cv, com rotação de até 1500 RPM, e é comandado por um
sistema de inversão de frequência. Há ainda desde 1972 um sistema de resgate,
cujo carro pode seguir pelo cabo de aço e retirar sete passageiros por vez. O
grupo de operações tem 50 pessoas e o de manutenção, 48.
Giuseppe
Pellegrini, diretor técnico da Companhia que administra os bondinhos, conta um
dos segredos mais bem guardados dos bondinhos. O que poucos sabem é que há
espalhados pelo local, incluindo os dois morros, 15 botões vermelhos
estrategicamente posicionados, mas fora da visão dos turistas. Acionados, estes
botões param imediatamente o funcionamento dos bondes. Em uma das salas de
comando, Pellegrini conta que nunca foi preciso apertar o botão de emergência. “Mas
garanto que funciona. Nos testes de simulação que fazemos, conseguimos detectar
qualquer problema que porventura possa surgir”, diz.
São
raros os acidentes ocorridos no local. Não há registros de vítimas fatais
nestes 100 anos de funcionamento dos bondinhos. Um fato histórico marcante
ocorreu em 1935, durante a Intentona Comunista, quando uma bala de canhão
atingiu as estações, que tiveram de ser fechadas por vários dias. Em 1951, um
cabo de tração se rompeu com bonde cheio e as pessoas foram retiradas durante a
noite. Mas foi no dia 22 de outubro de 2000 que ocorreu um acidente com
repercussão internacional. Um dos cabos de aço se rompeu, prendendo vários
turistas por horas no teleférico. Ninguém se feriu.
Pellegrini
também se tornou parte integrante da equipe do Pão de Açúcar por acaso. Era
alpinista e, num sábado de sol, aproveitava para escalar o lado direito do
morro da Urca quando, avistado pelo então presidente da administração local,
foi convidado a trabalhar ali. Já se vão cinquenta anos de bondinhos. “Faço
esta viagem entre os bondinhos todo dia. Me sinto privilegiado”,
afirma, cheio de sorrisos.
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