A seca castiga o Nordeste brasileiro |
Carlos Madeiro - UOL
A
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terra sem verde, os rios sem água e os animais
magros ou mortos pelos pastos do sertão denunciam que é época de seca no
Nordeste. Durante uma semana, o UOL
passou por cidades do semiárido de quatro Estados: Alagoas, Bahia, Pernambuco e
Sergipe.
O relato é
de um cenário desolador, que começa a ser percebido a pouco mais de 100 km do
litoral, quando a paisagem verde vai dando lugar à terra seca e rachada.
A
tranquilidade das estradas é quebrada pelo trânsito dos carros-de-boi e
caminhões-pipa, que circulam a todo instante transportando água para as
comunidades. Mas a fisionomia desiludida do nordestino –em meio a um fenômeno
comum na região– aponta que essa não é uma seca como outra qualquer.
Apesar
de acostumados com a falta de chuvas em boa parte do ano, os sertanejos
relatam, quase de forma unânime, que dessa vez o “castigo” foi maior. Muitos
falam que essa é “a pior seca da história”, similar à vivida pelo Nordeste há
42 anos.
Ao
todo, segundo dados das defesas civis estaduais, mais de 750 municípios já
decretaram situação de emergência por conta da estiagem e mais de 4 milhões de
pessoas estariam em áreas diretamente afetadas.
No
sertão alagoano, rios como o Traipu e o Ipanema, que sempre ajudam a abastecer
comunidades rurais nessa época do ano, estão secos. Na Bahia e em Pernambuco,
açudes que costumavam garantir a água para os animais também secaram ou estão
prestes a secar. Sem poços ou sistemas de irrigação, a única solução é apelar
para os carros-pipa.
“Aqui na região nunca vi uma seca como essa na vida. Já
tivemos algumas outras, mas ficar completamente sem água como agora, não ouvi
dizer. Só Deus para nos salvar”, afirma José Carlos Nunes, 41, morador de
Santa Brígida, no sertão baiano, onde não chove há mais de oito meses.
DADOS OFICIAIS
Somente
na Bahia a seca já é considerada pelo governo estadual como a pior dos últimos
47 anos –mais de 200 municípios estão em situação de emergência no Estado.
Imagens
captadas pelo satélite Meteosat-9 mostram que boa parte do Nordeste enfrenta a
maior seca dos últimos 30 anos. Em imagens produzidas pelo Laboratório de
Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis) da Universidade Federal
de Alagoas (Ufal) é possível ver, por exemplo, que 80% do semiárido da região
sofre com a estiagem este ano, o que representa seis vezes o percentual
registrado no ano passado.
A
diferença gritante entre os cenários pode ser comprovada pelas áreas em
vermelho:
Mapas mostram a situação da seca no Nordeste, as áreas em vermelho. A imagem à esquerda (abril de 2011) mostra 15% da região atingida, já a imagem à direita (abril de 2012) mostra 80% |
Contudo,
segundo o meteorologista e coordenador do Lapis, Humberto Barbosa, a mensuração
exata do tamanho da seca no Nordeste não é possível de ser realizada, já que há
uma série de fatores e dados que têm de ser levados em conta. Além disso, a
estiagem registrada este ano ainda não teve seu ciclo encerrado.
“Os índices de seca mais simples consideram somente
variáveis meteorológicas e/ou hidrológicas. Mas os mais sofisticados associam a
chuva a parâmetros econômicos, sociais, culturais, ambientais e políticos das
regiões atingidas. No National Drought Mitigation Center, nos EUA, por exemplo,
a seca é baseada em fatores meteorológicos, hidrológicos, agrícolas e
socioeconômicos. Os índices de secas constituem ferramentas essenciais para um
diagnóstico mais preciso de sua dimensão nas regiões atingidas, existindo para
isso vários modelos de avaliação.”
Barbosa
diz que a falta de documentação e de tecnologia impediu a mensuração dos
efeitos da seca em décadas passadas. Segundo o meteorologista, o primeiro
grande registro de grande seca no Nordeste ocorreu entre 1877-79, mas foi
registrada apenas por relatos.
“Segundo os relatos históricos, teriam perecido cerca de
500 mil nordestinos, vitimados pela fome, sede, epidemias, falta de condições
sanitárias, ausência de infraestrutura e de intervenção governamental para
assistir as populações atingidas”, diz.
SECA DE 1970
Entre
os mais velhos, os relatos sempre comparam a seca atual com a enfrentada em
1970. Aquele ano, segundo historiadores, foi considerado o ápice de um ciclo
seco que assolou o Nordeste e provocou a retirada de milhares de sertanejos
para o Sudeste. A severa estiagem causou a morte de animais e seres humanos,
além de ser responsável pela geração subnutrida que surgiu no semiárido.
A
partir daquela seca, o problema passou a ter repercussão nacional, e o governo
federal criou o Proterra (Programa de Redistribuição de Terra e de Estímulo à
Agroindústria do Norte e Nordeste) - que teria sido um dos primeiros projetos
políticos para tentar ajudar o sertanejo.
“Naquele ano foi uma seca muito grande, mas pensei que
nunca mais íamos ter. Depois tivemos algumas secas até grandes, mas que, pelo
que eu saiba, não atingiu todos os Estados como essa agora. Tenho parentes em
Alagoas, e eles falam a mesma coisa daqui, que nunca viram um sofrimento como
esse”,
diz José Luiz do Nascimento, 65, morador de Santa Brígida (BA). “Morreram
animais demais naquele tempo.”
Apesar
da semelhança com 1970, os relatos apontam que a seca de 2012 se apresenta com
nuances ainda mais graves. “Em 1970 dava pelo menos relâmpago, meu
filho. Nessa não deu nem um”, conta Milton José do Nascimento, 72,
morador de Petrolândia (PE).
“Naquela época, a gente tinha mais barreiros, que hoje
estão secos. E o problema é que estamos no começo, e se não chover nos próximos
meses, vamos ter uma seca ainda pior. E a previsão é que não chova”, diz o pecuarista e
secretário de Infraestrutura de Batalha, no sertão alagoano, Abelardo Rodrigues
de Melo. No município, a prefeitura contabiliza 149 barreiros secos.
ANIMAIS E PRODUÇÕES ARRASADAS
Sem
água, os animais estão passando fome e morrendo, assim como as tradicionais
plantações de milho e feijão -que garantem alimentos de subsistência por muitos
meses do ano–, que sequer foram feitas.
“Todo ano a gente planta, mas esse ano não choveu nada,
não tem como plantar nada. Não lembro a última vez que não plantei. Ano passado
cheguei a plantar, mas perdi tudo, porque depois do inverno não choveu nadinha”, relata Pedro
Alexandre, 61, morador de Poço Redondo, cidade mais afetada de Sergipe, onde
não chove desde setembro. Lá, segundo a Defesa Civil municipal, todas as 141
comunidades rurais estão sendo atingidas.
A
chuva esperada por Alexandre e por todos os sertanejos deveria ter caído entre
fevereiro e abril, meses que garantem a produção, mas ela não veio -nem em
pequena quantidade.
“Estamos com 38 caminhões-pipa abastecendo as
comunidades, mas podíamos ter cem que não atenderia à demanda. Temos 70% da
população vivendo na zona rural. O abastecimento humano está garantindo, mas o
maior problema é o abastecimento animal, que é complicado. O gado está morrendo
e não temos água para atender”, afirma o secretário de Agricultura de Poço
Redondo, Sílvio de Jesus.
Excelente a reportagem, entretanto o que está acontecendo é uma repetição desse fato, que nunca o governo brasileiro solucionou porque falta de uma decisão política. Recursos técnicos e naturais existem suficientemente.
ResponderExcluirVisitem o facebook CACTO Resistência e deixe seus comentários. Parabens pela reportagem.
Ivanês Lopes
Presidente e Fundador da CACTO Resistência.